Era tudo pose. O cabelo dramaticamente organizado em camadas que balançavam ao vento. A bolsa, réplica de marca famosa, carregava um telefone celular pré-pago, batom, lixa de unha e uns cacarequinhos bobos que de nada serviam além de dar volume ao couro - de seringueira - marrom.
O ônibus sacolejava e em igual sacolejo estavam sincronizados os cabelos e os badulaques dentro da bolsa. Não era necessário olhar raio-X para saber o que carregava a bolsa muito menos para saber o que estava dentro da cabeçazinha que sustentava as madeixas loiro-envelope. Desceu do ônibus e num salto cuja sustentação humana seria impossível em condições normais e, atravessou, fora da faixa, a avenida tão comprida quanto uma belém-brasília da vida.
Do nada veio uma van-kombi-perua e atingiu os saltos, os cabelos e a bolsa; saltos e bolsa foram atirados ao longe e os cabelos caíam lentamente e balançados por um zéfiro. Em menos de vinte e oito segundos uma multidão estava ao redor da cena do acidente.
A moça levantou, disse estar tudo bem, conferiu as unhas exageradamente polidas e vermelhas, retocou o batom e terminou de atravessar a avenida. Nada sofreu de grave além de um corte superficial na testa perfeitamente curável com band-aid e mercúrio cromo. Era tudo pose.