sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

34


Era tudo pose. O cabelo dramaticamente organizado em camadas que balançavam ao vento. A bolsa, réplica de marca famosa, carregava um telefone celular pré-pago, batom, lixa de unha e uns cacarequinhos bobos que de nada serviam além de dar volume ao couro - de seringueira - marrom.

O ônibus sacolejava e em igual sacolejo estavam sincronizados os cabelos e os badulaques dentro da bolsa. Não era necessário olhar raio-X para saber o que carregava a bolsa muito menos para saber o que estava dentro da cabeçazinha que sustentava as madeixas loiro-envelope. Desceu do ônibus e num salto cuja sustentação humana seria impossível em condições normais e, atravessou, fora da faixa, a avenida tão comprida quanto uma belém-brasília da vida.

Do nada veio uma van-kombi-perua e atingiu os saltos, os cabelos e a bolsa; saltos e bolsa foram atirados ao longe e os cabelos caíam lentamente e balançados por um zéfiro. Em menos de vinte e oito segundos uma multidão estava ao redor da cena do acidente.

A moça levantou, disse estar tudo bem, conferiu as unhas exageradamente polidas e vermelhas, retocou o batom e terminou de atravessar a avenida. Nada sofreu de grave além de um corte superficial na testa perfeitamente curável com band-aid e mercúrio cromo. Era tudo pose.

7 comentários:

  1. Invejo seu dom de descrição, que de tão pouco torna-se muito.

    Abraço.

    ResponderExcluir
  2. Você escreve graciosamente bem. É raro ver textos tão sutis quanto.
    Parabéns! Bom post =]

    ResponderExcluir
  3. bonito texto...

    http://cemiteriodaspalavrasperdidas.blogspot.com/2009/12/tall-man.html

    ResponderExcluir
  4. Obrigado Eduarda, Gabriela e Rafa! Espero que continuem lendo e dando opinião no que escrevo!
    Abraço ...

    ResponderExcluir
  5. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  6. vc descreve as coiasas MUITO bem! bunito! (seguindo!)

    ResponderExcluir
  7. é muito bom de devanear seus textos. Talentoso você.

    ResponderExcluir