A filha menos querida, única prestativa sem dramas ou reclamações, ajuda ao pai com sua organização minuciosamente clínica. Todos os finais de semana desde a morte da mãe - Deus a teve - dedica seus préstimos domésticos à casa paterna. É um zelo sem igual.
O velho, um aposentado rabugento, passa mais da metade do seu dia útil sentado numa poltrona de couro marrom, de onde, confortavelmente dita regras para o andamento (caótico) da casa. A poltrona, presente da filha menos querida em comemoração a aposentadoria do pai, ficou guardada na garagem por quinze anos. O retorno da poltrona a superfície - superfície levando em conta o posicionamento da garagem em relação aos outros dois pavimentos da casa - se deu quando à morte da esposa, o velho precisou de algo igualmente grande, quente e confortável para completar a lacuna que a esposa deixara.
(São quatro filhos ao todo: três mulheres já feitas e um moço ainda em má formação).
No imaginário da vizinhança, constituída de uns tipos interessantemente caricatos, àquele lar é um lar feliz. Quanta imaginação atrapalhada. A casa vive em bagunça e a santa filha menos querida sempre tenta manter a ordem. O pai, ingrato, apenas resmunga; palavras claras e límpidas só são ouvidas quando “nunca atendem um pedido simples” ou “ainda não trouxe meu café”. Como a esposa deve fazer falta. Embora a coitada deva estar agora, não importa onde, mais tranqüila. Os outros filhos moram na casa paterna e abusam sem dó dos préstimos da irmã. Que santa!
(Tal situação precisa acabar logo. Filha menos querida não merece mais sofrer. Mas, não pensem que algum príncipe irá salvá-la ou algo do gênero. Ser reconhecida como filha redentora, muito menos).
No sábado mais bonito daquele mês, filha menos querida acorda cedo-ainda-escuro, prepara um delicioso café da manhã, medica o pai e com suas prendas domésticas deixa a casa um verdadeiro brinco de diamantes. Em estado bruto. Arruma suas coisas na habitual valise preta e sai com um ar triunfante de dever cumprido.
Filha-menos-querida ir embora para sempre e nunca mais voltar já seria vingança suficiente para aquela família; mas por um descuido ingênuo durante o fazer do café da manhã, o gás ficou ligado. Algumas pessoas (in)felizmente não resistem ao gás butano. Ligado por horas em ambiente fechado sem ventilação pode até fazer mal a saúde.
Um silêncio pacífico e comovido foi promovido. Os cretinos ficaram, finalmente, em convergência.
Nossa, acho que vc me deu uma ideia! ahuhuauhahuahuahuauha. Zuera. Tava sentindo falta dos seus textos! Beijooo
ResponderExcluirme lembrou virgens suicidas.
ResponderExcluirVocê tinha razão.. eu estava esperando pelo desfecho o tempo todo!
ResponderExcluirmuito bom, Irgo!
Vou dar uma dica: não façam isso em casa.
ResponderExcluireu gostei desse texto, bem bacana :D
ResponderExcluireu adorei muito mesmo.
ResponderExcluirPassa no meu tbm ok?
mas sobre o texto, achei lindo!
beijos
gente, quase que nao acabo, fiquei passado com o desfecho mas amei
ResponderExcluirNão sei se este descuido foi tão ingênuo assim...ainda acho q ela é uma psicopata....quem sabe até foi ela quem provocou a morte da mãe...
ResponderExcluirela faz as coisas pra ser vista como uma coitada,vítima...mas sem a máscara ela deve ser um monstro!!!hauahaua...nossa,até o irmão com má formação ela deu um jeito de matar...
Adorei, me identifiquei aliás, mas não sou santa, só a menos querida. Parabéns, visitarei mais !
ResponderExcluirMUITO BACANA
ResponderExcluirmuito show
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